quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

SENSO COMUM

- O senso comum é um conjunto de conhecimentos variados sobre coisas específicas. Este conhecimento informal é adquirido com a vida prática, e nem notamos que o temos até que somos questionados a este respeito. Exemplo: sabemos que, ao entrarmos em um elevador onde já se encontra uma pessoa, não devemos parar de frente para ela e ficar encarando.
- O senso comum nem sempre é comum de maneira absoluta. Diferentes culturas são compostas de pessoas que agem e encaram o mundo de diferentes formas.
- Como o senso comum é formado por pequenos conhecimentos, adquiridos isoladamente, estes "conhecimentinhos" podem contradizer uns aos outros.
- Por isso, o senso comum funciona bem para embasar pequenas decisões ("o que vou vestir hoje?"), que atendem necessidades existentes no presente, e num espaço específico.
- Por outro lado, como conseguimos facilmente tomar estas pequenas decisões, temos a ilusão de que o senso comum também consegue fundamentar grandes posicionamentos, sobre questões complexas relativas ao futuro. É por isso que as pessoas vivem opinando sobre questões políticas, sociais e econômicas sem nunca ter buscando informações a respeito: o cacoete do senso comum nos leva a acreditar que podemos opinar sobre qualquer coisa.
- O senso comum nos leva a crer que podemos fazer previsões e dar sentido a atitudes, quando na verdade na maioria das vezes sequer podemos enumerar todos os fatores relevantes que levam a determinado desfecho. Exemplo: quando vemos alguém comprar um vinho, atribuímos sua escolha ao gosto e condições financeiras do comprador; contudo, outros fatores são importantes, desde a finalidade do vinho e o humor do comprador, até a influência inconsciente exercida pela música que tocava no momento da compra.
- Seres humanos superestimam a racionalidade uns dos outros. Por isso, como tentamos estimar o processo de escolha de outros humanos, presumimos que trata-se de um processo lógico, e ignoramos fatores valorativos, emocionais, de condicionamento social, ou até a forma como tendemos a escolher teorias/filosofias que reforçam aquilo que já pensávamos ou sentíamos.
- O senso comum preenche lacunas, nos levando a acreditar que sabemos sobre uma coisa por ter tido contato com ela. Exemplo: é comum que quadros negros sejam da cor verde e, por isso, quando perguntados sobre a cor dos quadros de suas salas, muitos alunos afirmaram serem verdes mesmo quando eram azul.
- O senso comum é capaz de moldar o gosto de público. Se uma série de circunstâncias específicas se desenrolar levando uma obra ao sucesso, as pessoas já vão condicionadas a concordar que a obra é muito boa antes de saber o porquê, e se discordarem vão achar que é por ignorância pessoal ("não sou inteligente o suficiente, por isso não estou vendo o que tem de tão especial nessa obra"). Quando perguntadas, as pessoas que gostaram da obra vão dizer que seu sucesso se deve às suas características. No entanto, é provável que uma série de outras obras com as mesmas características não tenham atingido o mesmo sucesso.
- O senso comum leva ao raciocínio circular, que pode ser uma ferramento útil às pessoas que querem simplesmente justificar seus preconceitos. Exemplo: adoção por casais gays não é possível porque a sociedade não está pronta → a sociedade não está pronta porque não está acostumada a ter contato com famílias com membros homossexuais  a sociedade não quer ter contato com famílias com membros homossexuais porque não está pronta.
- O modelo de motim de Granovetter sugere que determinadas condutas se tornam mais aceitáveis porque outras pessoas a adotaram.  
- É comum que seja atribuído maior poder de influência a "pessoas especiais" (ex: famosos). No entanto, fatores circunstanciais têm grande papel no processo de formação de uma tendência. Exemplo: um grande incêndio numa floresta não pode ser atribuído somente ao quão especial era a faísca inicial, mas também ao vento, à umidade do ar, à vegetação próxima à fagulha etc.
- De outro lado, cientistas sociais já chegaram à conclusão de se encontrarmos pessoas comprometidas o suficiente, estamos a seis/sete apertos de mão de qualquer pessoa do mundo.
- Muitas vezes o poder dos influenciadores têm muito mais a ver com a suscetibilidade à manipulação do público que os acompanha, do que propriamente às qualidades do influenciador em questão. Também tem a ver com o poder de influência da pessoa que recebeu a informação, e que pode ou não convencer outras pessoas a passarem a diante aquela tendência em potencial, numa espécie de contágio.
- Assim, um grande número de "influenciadores acidentais" pode ser muito mais determinante, para espalhar uma tendência, do que algumas "pessoas sociais". 
- Pode-se dizer que uma parte do senso comum é adquirido por meio do que aprendemos com a história. O problema é que para descobrirmos se A aconteceu por causa de B, precisamos testar isso várias vezes; a história, por sua vez, não pode ser testada  porque só acontece uma vez.
- O fato de a história só acontecer uma vez, ao invés de gerar questionamentos acerca dos reais motivos por trás de um evento histórico, faz o contrário: surge um determinismo que faz os acontecimentos e o nexo causal entre eles parecerem inevitáveis → "teria acontecido de qualquer forma". 
- Isso acontece por causa de algo chamado viés retrospectivo: aquele sentimento de "eu sabia disso o tempo todo".
- O determinismo nos faz deixar de prestar atenção em tudo o que poderia ter acontecido, mas não aconteceu. Exemplo: aquela obra que tinha todas as características de obra boa, mas não chegou ao sucesso.
- Tudo isso faz com que nós estabelecemos uma série de nexos causais (relação entre causa e consequência) inexistentes ou precários, que nos levam a aprendizados ainda mais precários que passam a fazer parte do senso comum.
- Outro problema de tentar aprender com a história é que só sabemos o que foi historicamente relevante anos após um acontecimento, quando já se deram todos os seus desdobramentos sociais, econômicos e etc. Já no presente, não podemos determinar qual pequena fagulha será relevante o suficiente para colaborar e formar um incêndio; tampouco podemos ter conhecimento da infinidade de coisas que estão acontecendo acontecendo simultaneamente, e que também ajudarão a causar o incêndio.
- Além disso, os desdobramentos a curto, médio e longo prazo de um evento podem alternar: algo pode ser bom a curto prazo e ter consequências nefastas no futuro distante.
- Por fim, a maneira como a história é contada pode nos induzir a erros. As vezes tudo parece ter acontecido por um motivo racional, quando na verdade uma série de atitudes historicamente determinantes foram tomadas pelos mais aleatórios motivos. 
- Segundo já dito, por meio do que aprendemos com a história formamos o senso comum, e por meio do senso comum formamos opiniões e fazemos previsões que pautam nossas atitudes atuais. O que acontece é que, em razão das emboscadas da história e do senso comum, não sabemos distinguir uma previsão simples ("amanhã vai fazer sol naquela cidade em que sempre faz sol") de uma previsão complexa ("em quais ações coloco meu dinheiro?").
- Prever eventos sociais é difícil por causa da complexidade das relações dentro da sociedade. Por isso, o melhor que podemos fazer é estabelecer probabilidades.
- Há também a dificuldade de saber o que prever. Em 1930 ninguém perderia tempo tentando prever quais Youtubers seriam relevantes hoje, porque sequer se concebia o conceito de internet, tampouco de um site onde as pessoas podem livremente se expressar e entreter outras pessoas.
- Outra dificuldade está no que Duncan J. Watts chama de "Cisnes Negros": eventos muito relevantes, mas extremamente raros. Como aprendemos com a história e com o que acontece costumeiramente, algo que nunca aconteceu antes e que não é costumeiro se torna impossível de prever.

Este texto é formado de pequenos aprendizados que extrai da primeira metade do livro Tudo é Óbvio: desde que você saiba a resposta.


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