domingo, 5 de março de 2023

Rápido e Devagar, de Daniel Kahneman (RESUMO)

 

"Rápido e Devagar" é um livro escrito pelo renomado psicólogo Daniel Kahneman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 2002. Neste livro, Kahneman apresenta uma análise detalhada de como a mente humana funciona, mostrando como os processos mentais de raciocínio, tomada de decisão e julgamento são influenciados por diversos fatores, como emoções, crenças, vieses cognitivos e outros aspectos da psicologia humana.

O livro é dividido em duas partes: a primeira parte, intitulada "Rápido", aborda o sistema de processamento mental rápido e automático, que Kahneman chama de "Sistema 1". Ele explica como esse sistema é responsável pela maioria das nossas decisões e como ele é muitas vezes influenciado por fatores emocionais e cognitivos que nem sempre levamos em conta.

A segunda parte, intitulada "Devagar", apresenta o sistema de processamento mental lento e deliberativo, que Kahneman chama de "Sistema 2". Ele mostra como esse sistema é responsável pela resolução de problemas mais complexos e como ele pode ser influenciado por fatores como cansaço, falta de atenção e outros aspectos da cognição humana.

Ao longo do livro, Kahneman utiliza exemplos práticos e estudos científicos para ilustrar suas ideias e mostrar como podemos nos tornar mais conscientes dos processos mentais que influenciam nossas decisões. Ele também discute como podemos aprender a controlar esses processos e tomar decisões mais conscientes e informadas, tanto na vida pessoal quanto profissional.

PARTE 1 - DOIS SISTEMAS

1. OS PERSONAGENS DA HISTÓRIA 

O "Sistema 1" e o "Sistema 2", para ilustram a dualidade da mente humana.

O "Sistema 1" é descrito como o sistema de processamento mental rápido e automático, responsável pela maioria das nossas decisões cotidianas, como reconhecer rostos, dirigir um carro ou sentir medo. Ele é influenciado por fatores como emoções, instintos e associações de memória, e pode levar a decisões impulsivas e viesadas.

Por outro lado, o "Sistema 2" é o sistema de processamento mental lento e deliberativo, que é responsável por resolver problemas complexos e tomar decisões conscientes e racionais. Ele requer mais esforço cognitivo e é influenciado por fatores como atenção, memória de trabalho e autocontrole.

Kahneman argumenta que os dois sistemas de processamento mental trabalham juntos para moldar nossa experiência cognitiva e que a interação entre eles pode afetar nossas decisões de maneiras diferentes. Ele também destaca a importância de entender esses sistemas para melhorar nossas habilidades de tomada de decisão e evitar vieses cognitivos que podem prejudicar nossas escolhas.

2. ATENÇÃO E ESFORÇO

A atenção e o esforço cognitivo afetam nossas decisões e julgamentos.

A nossa capacidade de atenção é limitada e isso pode levar a erros de percepção e memória. 

"Carga cognitiva" é a quantidade de esforço mental necessário para realizar uma tarefa. Quando a carga cognitiva é alta, nossas habilidades de tomada de decisão e resolução de problemas são afetadas negativamente, pois temos menos recursos cognitivos disponíveis para trabalhar.

A fadiga mental pode afetar nossa capacidade de autocontrole e levar a decisões impulsivas e viesadas. Há estudos que mostram que o esgotamento mental pode levar a comportamentos pouco éticos e a uma maior suscetibilidade a vieses cognitivos.

Algumas estratégias para lidar com esses desafios cognitivos incluem a prática de mindfulness e a redução da carga cognitiva. 

3. O CONTROLADOR PREGUIÇOSO

O "Sistema 2" é preguiçoso e relutante em tomar decisões, principalmente quando está cansado ou sobrecarregado. Ele consome muita energia mental e tendemos a evitá-lo sempre que possível, optando pelo Sistema 1, que é mais rápido e fácil de usar. 

Mesmo quando usamos o Sistema 2, muitas vezes não tomamos as melhores decisões, pois somos influenciados por vieses cognitivos e outras limitações cognitivas.

Há estudos que mostram que a preguiça do Sistema 2 pode levar a erros de julgamento e decisões pouco informadas. A preguiça mental pode ser exacerbada por fatores externos, como prazos apertados, pressão social e outras demandas que podem aumentar a carga cognitiva.

Algumas estratégias que podemos adotar para lidar com a preguiça do Sistema 2 e tomar decisões mais conscientes e informadas incluem a adoção de hábitos que promovem a saúde mental, como uma boa noite de sono e a prática de exercícios físicos, além de técnicas de gerenciamento do tempo e do esforço mental, como a divisão de tarefas em partes menores e a eliminação de distrações.

 4. A MÁQUINA ASSOCIATIVA

Nossas mentes fazem associações automáticas entre diferentes ideias e conceitos. Essas associações podem influenciar nossas decisões e comportamentos. Tais associações mentais podem levar a estereótipos e preconceitos, como o fato de associarmos automaticamente as mulheres aos cuidados domésticos ou os homens à liderança. Elas também podem ser influenciadas por fatores externos, como o ambiente em que estamos ou as informações que recebemos.

As associações podem ser reforçadas pelo "efeito de mera exposição", que é a tendência de gostarmos mais de algo simplesmente porque já estamos familiarizados com ele. Segundo estudos, esse efeito pode influenciar nossas preferências e escolhas, mesmo que não estejamos conscientes disso.

A exposição a diferentes perspectivas e informações, a prática da reflexão crítica e a adoção de um pensamento mais consciente e deliberativo são maneiras de combater tais influências.

5. CONFORTO COGNITIVO

Tendemos a buscar informações que confirmam nossas crenças e ignorar aquelas que as desafiam, criando assim um "conforto cognitivo". Por conseguinte, o viés de confirmação pode influenciar nossas decisões e julgamentos, levando-nos a ignorar evidências que vão contra nossas crenças e a buscar ativamente evidências que as confirmam.

O conforto cognitivo pode ser exacerbado por outros fatores, como a polarização política e a pressão social para conformidade. 

Para lidar com o conforto cognitivo, devemos buscar a exposição a diferentes perspectivas e ideias, o desafio de nossas próprias crenças e a busca ativa por informações que possam contradizer nossas visões de mundo. 

6. NORMAS, SURPRESAS E CAUSAS

Nosso julgamento é influenciado por nossas expectativas e normas sociais, bem como por nossa capacidade de detectar padrões e causalidade.

As expectativas podem levar a erros de julgamento, como quando julgamos erroneamente o desempenho de uma pessoa com base em nossa expectativa anterior sobre ela. Ademais, as normas sociais podem influenciar nossos julgamentos, como quando seguimos a maioria mesmo quando sabemos que estão errados.

Nossa capacidade de detectar padrões e causalidade pode levar a erros de julgamento, como quando atribuímos causalidade a eventos que são simplesmente aleatórios ou coincidentes. Isso pode levar a superstições e crenças infundadas.

Daí a importância de estar consciente de nossas expectativas e normas, adotar uma abordagem mais analítica para detectar padrões e causalidade, e considerar múltiplas perspectivas e fontes de informação. 

7. UMA MÁQUINA DE TIRAR CONCLUSÕES PRECIPITADAS

Nosso sistema de pensamento rápido (Sistema 1) muitas vezes nos leva a tirar conclusões precipitadas com base em informações limitadas.

Nossos preconceitos e estereótipos podem influenciar nossas conclusões, mesmo quando sabemos que estão errados. A familiaridade e a facilidade de processamento de informações podem levar a conclusões imprecisas e estereotipadas.

O viés de confirmação pode levar a conclusões precipitadas, quando estamos inclinados a acreditar em informações que confirmam nossas crenças pré-existentes e ignorar informações que as contradizem.

8. COMO OS JULGAMENTOS ACONTECEM

Nosso sistema de pensamento rápido (Sistema 1) e nosso sistema de pensamento lento (Sistema 2) trabalham juntos para formar nossos julgamentos, os quais são influenciados por heurísticas mentais, que são atalhos cognitivos que usamos para tomar decisões rapidamente. Exemplo de como essas heurísticas podem levar a erros de julgamento: viés de disponibilidade (julgar a probabilidade de um evento com base em como facilmente podemos lembrar de exemplos dele).

O sistema de pensamento lento pode ser usado para corrigir os erros de julgamento do Sistema 1. Para tal, é importante a reflexão cuidadosa, consideração de múltiplas perspectivas e da busca de evidências antes de chegar a uma conclusão.

9. RESPONDENDO A UMA PERGUNTA MAIS FÁCIL 

Muitas vezes respondemos a perguntas mais fáceis do que as que são realmente feitas a nós. isso pode levar a respostas imprecisas e como podemos ser levados a tomar decisões baseadas em informações irrelevantes. nossas emoções e humores podem afetar nossas respostas e como podemos ser influenciados por perguntas que nos são apresentadas de uma certa maneira.

Podemos ser levados a fazer julgamentos com base em informações que não são relevantes para a pergunta que nos é feita e como podemos ser influenciados por exemplos específicos que são apresentados a nós.

PARTE 2 - HEURÍSTICAS E VIESES

10. A LEI DOS PEQUENOS NÚMEROS

As pessoas tendem a tirar conclusões a partir de amostras pequenas, incluindo nossas próprias experiências pessoais e histórias que ouvimos de outras pessoas.

A Lei dos Grandes Números pode ajudar a corrigir esses erros de julgamento, pois a amostragem aleatória pode levar a estimativas mais precisas de probabilidade e a média de uma grande amostra pode ser um indicador mais confiável do que a média de uma amostra pequena.

Podemos melhorar nossa capacidade de fazer julgamentos precisos, incluindo a importância de buscar informações de fontes confiáveis, examinar amostras maiores e usar dados estatísticos para informar nossas decisões.

11. ÂNCORAS

A mente humana é influenciada por informações que recebemos no início de um processo de tomada de decisão, que podem distorcer nossas estimativas subsequentes.

As âncoras podem influenciar nossos julgamentos, como em um jogo de roleta em que a bola cai em um número específico, e em seguida, os jogadores são mais propensos a acreditar que a bola cairá em torno daquele número no futuro, mesmo que a probabilidade real seja uniforme.

As âncoras podem ser usadas para influenciar as decisões em diferentes áreas, como em processos judiciais e de negociação salarial, onde as primeiras ofertas podem afetar significativamente os resultados finais.

A ancoragem pode ser mitigada através da conscientização de seu impacto, da busca por informações alternativas e da análise de cenários hipotéticos.

As âncoras são uma parte inevitável do processo de tomada de decisão humano, mas é importante estar ciente de seu efeito e como ele pode ser usado para influenciar nossas decisões.
 
12. A CIÊNCIA DA DISPONIBILIDADE
 
As pessoas tendem a avaliar a probabilidade de um evento com base na facilidade com que ele vem à mente. Isso é conhecido como heurística da disponibilidade.

Exemplo: as pessoas tendem a superestimar a frequência de divórcios em suas comunidades com base em casos recentes que podem ter recebido muita atenção da mídia.

A disponibilidade pode ser influenciada por diferentes fatores, como a mídia, as emoções e a familiaridade. Eventos emocionais tendem a ser mais disponíveis em nossa mente, o que pode levar a uma superestimação de sua probabilidade.

A busca por informações e a reflexão crítica podem ajudar a equilibrar a tendência de confiar na disponibilidade. A construção de modelos mentais pode ajudar a reduzir a influência da disponibilidade, permitindo uma análise mais racional e menos emocional dos eventos.

 
13. DISPONIBILIDADE, EMOÇÃO E RISCO
 
A heurística da disponibilidade pode influenciar a maneira como as pessoas percebem o risco em diferentes situações. Ela pode ser influenciada por fatores emocionais, como o medo, a ansiedade e a raiva, e essas emoções podem afetar a maneira como as pessoas avaliam a probabilidade de eventos perigosos ou arriscados. Exemplo: em casos de terrorismo, a mídia tende a destacar eventos raros, mas altamente dramáticos, o que pode levar as pessoas a acreditar que o risco é maior do que realmente é.
 
Da mesma forma, em muitos casos as pessoas são mais propensas a assumir riscos quando estão expostas a informações disponíveis que sugerem que o risco é baixo, mesmo que as informações sejam limitadas ou incompletas.
 
14. A ESPECIALIDADE DE TOM W
 
Kahneman apresenta um estudo de caso sobre um médico que trabalhava em uma sala de emergência e era conhecido por sua habilidade em fazer diagnósticos precisos em situações de alta pressão.

Kahneman explora as razões pelas quais Tom W. era tão habilidoso em seu trabalho, argumentando que sua expertise era baseada em uma combinação de experiência prática, conhecimento teórico e intuição.

Ele discute como a expertise de Tom W. era influenciada pelo "sistema 1" de pensamento, que é responsável por pensamentos automáticos e rápidos, bem como pelo "sistema 2" de pensamento, que é mais analítico e deliberativo.

Kahneman também explora as limitações da expertise de Tom W., sugerindo que ela pode ser afetada por vieses cognitivos, como a tendência de confiar em informações disponíveis e ignorar dados irrelevantes.

Ele conclui que a especialidade de Tom W. é um exemplo de como a experiência e o conhecimento podem levar a um pensamento mais rápido e preciso, mas que a especialidade também tem suas limitações e pode ser afetada por vieses cognitivos.
 
15. LINDA: MENOS É MAIS

Um experimento apresentou aos participantes uma descrição de uma mulher chamada Linda, que era descrita como inteligente, engajada em questões sociais e com forte senso de justiça. Os participantes foram então solicitados a responder a duas perguntas: qual é a probabilidade de Linda ser uma bancária? E qual é a probabilidade de Linda ser uma bancária e também ativista feminista?

Embora a resposta lógica seja que a probabilidade de Linda ser uma bancária é maior do que a probabilidade de ser uma bancária e ativista feminista, a maioria dos participantes do estudo optou pela segunda opção. Isso ocorreu porque a descrição de Linda como uma ativista feminista fazia com que ela parecesse mais característica de um grupo específico, levando as pessoas a confiar em estereótipos e ignorar dados estatísticos.


16. CAUSAS SUPERAM ESTATÍSTICAS
 
Existe uma tendência humana de buscar explicações causais para os eventos (narrativa), em vez de depender apenas de estatísticas. 
 
Uma narrativa é uma história coesa e compreensível que explica um evento ou resultado. As narrativas são importantes porque fornecem uma sensação de coerência e controle, mas muitas vezes são baseadas em poucos exemplos e não levam em conta a incerteza inerente aos eventos.

A heurística da disponibilidade pode levar a erros na construção da narrativa, pois os exemplos mais memoráveis podem ser atípicos ou distorcidos.

A teoria causal pode ser útil para explicar eventos, mas também pode levar a erros, como quando as pessoas atribuem causalidade a eventos aleatórios ou coincidentes.

17. REGRESSÃO À MÉDIA

A regressão à média refere-se ao fato de que, em uma série de medições de uma variável que apresenta algum grau de aleatoriedade, medições extremas tendem a ser seguidas por medições mais próximas da média na próxima vez em que a medição for realizada. Pode levar a conclusões errôneas e ações inadequadas se não for compreendida corretamente.

Aas pessoas tendem a buscar explicações causais para eventos extremos, em vez de considerar a aleatoriedade e a regressão à média. Por isso é importante reconhecer e considerar a aleatoriedade e a incerteza ao tomar decisões e tirar conclusões.
 
18. DOMANDO PREVISÕES INTUITIVAS

As pessoas muitas vezes confiam demais em suas intuições e tomam decisões com base em previsões que não são tão precisas quanto imaginam.

Kahneman apresenta o conceito de "previsibilidade limitada", que significa que as pessoas só podem fazer previsões dentro de um conjunto limitado de circunstâncias. Ele também discute a ideia de que as pessoas muitas vezes fazem previsões com base em exemplos passados que são facilmente acessíveis em suas mentes, o que pode levar a erros de julgamento.
 
PARTE 3 - CONFIANÇA EXCESSIVA
 
19. A ILUSÃO DE COMPREENSÃO
 
Os indivíduos muitas vezes superestimam a profundidade de sua compreensão sobre eventos e fenômenos complexos, e como essa ilusão pode afetar suas decisões e opiniões. As pessoas muitas vezes oferecem respostas simples para problemas complexos. 
 
A ilusão de compreensão é mais provável de ocorrer quando há uma história coerente para explicar o fenômeno, mesmo que essa história seja insuficiente ou enganosa. Ela pode levar as pessoas a serem excessivamente confiantes em suas próprias habilidades e a subestimar a incerteza e a complexidade de muitas situações. 
 
É importante sermos mais conscientes de nossas limitações cognitivas e reconhecer que não podemos compreender completamente todos os aspectos complexos da vida.

20. A ILUSÃO DE VALIDADE
 
As pessoas geralmente superestimam sua capacidade de previsão e tomada de decisão, e como a confiança na própria habilidade pode levar a erros caros. Os tomadores de decisão tendem a se concentrar em informações que confirmam suas hipóteses e ignoram ou desconsideram informações que contradizem suas crenças. Isso leva a decisões baseadas em suposições incorretas e à ilusão de que uma previsão é mais precisa do que realmente é.

21. INTUIÇÕES VERSUS FÓRMULAS
 
Muitas vezes as fórmulas e algoritmos são mais eficazes para tomar decisões do que as intuições humanas. Isso porque quando pessoas tomam decisões com base em sua intuição, muitas vezes são influenciadas por preconceitos e experiências pessoais.

Por outro lado, quando as pessoas utilizam fórmulas e algoritmos baseados em dados objetivos, as decisões tendem a ser mais precisas e confiáveis. Por isso empresas como a Google utilizam algoritmos para contratar funcionários.

Contudo, embora fórmulas e algoritmos possam ser mais confiáveis do que a intuição, eles não são infalíveis. É importante ter cuidado ao confiar cegamente em dados e em modelos matemáticos, pois eles também podem ser influenciados por vieses e limitações dos próprios dados.

Em resumo, cabe a nós encontrar um equilíbrio entre a intuição e o uso de fórmulas e algoritmos baseados em dados objetivos para tomar decisões mais precisas e confiáveis.

22. INTUIÇÃO DE ESPECIALISTA: QUANDO PODEMOS CONFIAR?
 
A intuição de um especialista é frequentemente baseada em seu conhecimento prévio e experiência em determinado assunto, o que pode ser muito valioso em determinadas situações.

No entanto, a intuição de especialistas nem sempre é precisa, pois pode ser afetada por vários vieses cognitivos, como a tendência de se concentrar em informações relevantes, mas ignorar outras importantes, ou a tendência de confiar demais em informações que confirmam suas crenças prévias.

23. A VISÃO DE FORA
É importante adotar uma perspectiva externa para tomadas de decisões e julgamentos mais acurados. Muitas vezes, estamos tão imersos em uma situação ou contexto que acabamos perdendo a objetividade e a capacidade de analisar a situação de forma crítica e ampla.

É necessário aprender a separar a emoção do pensamento racional. Muitas vezes, a empatia excessiva pode acabar prejudicando a tomada de decisões.

O autor apresenta a ideia de que as pessoas tendem a subestimar o impacto que fatores externos têm em seus julgamentos e ações. Ele cita o "Efeito Halo", em que a impressão geral que se tem de uma pessoa influencia a avaliação de suas habilidades em áreas específicas.
 
24. O MOTOR DO CAPITALISMO
 
As pessoas não são completamente racionais em suas decisões financeiras. O comportamento humano é afetado por vieses cognitivos, como o efeito da aversão à perda e o viés de confirmação. 
 
Esses vieses afetam a tomada de decisão dos investidores e levam a uma série de comportamentos irracionais no mercado financeiro.A crença na eficiência do mercado pode levar a uma falta de regulação que aumenta o risco de instabilidade econômica.

Por fim, Kahneman ressalta a importância da compreensão dos comportamentos humanos na economia e na política, e a necessidade de políticas públicas que levem em consideração as limitações da racionalidade humana.

PARTE 4 - ESCOLHAS

25. OS ERROS DE BERNOULLI
 
A teoria do valor esperado (por Daniel Bernoulli) assume que as pessoas são racionais e tomam decisões com base na maximização dos benefícios esperados, mas essa suposição é muitas vezes equivocada. Referida teoria não leva em consideração a aversão ao risco das pessoas, ou seja, sua tendência a evitar perdas. Outrossim, as pessoas tendem a atribuir pesos desproporcionais a eventos extremos, como grandes ganhos ou perdas, e isso pode afetar significativamente suas decisões financeiras.

Portanto, a teoria do valor esperado é útil, mas precisa ser complementada por outras abordagens para entender como as pessoas realmente tomam decisões financeiras.
 
26. TEORIA DA PERSPECTIVA
 
Daniel Kahneman apresenta uma abordagem alternativa à teoria do valor esperado, chamada de "teoria da perspectiva". Essa teoria se baseia na ideia de que as pessoas tomam decisões financeiras de maneira diferente dependendo da forma como as opções são apresentadas a elas.

Kahneman explica que a teoria da perspectiva considera não apenas o valor esperado de uma opção, mas também a forma como as pessoas percebem os ganhos e perdas associados a essa opção. 

O autor também discute o conceito de "efeito moldura", que se refere à forma como a informação é apresentada a uma pessoa pode influenciar sua decisão. Ele explica que as pessoas são mais propensas a assumir riscos quando a informação é apresentada de forma positiva e a evitar riscos quando a informação é apresentada de forma negativa.

27. O EFEITO DOTAÇÃO

As pessoas em valorizam mais os bens que possuem do que aqueles que não possuem. Isso é conhecido como o "efeito da dotação" e é uma das tendências comportamentais mais fundamentais que influenciam nossas decisões econômicas.
 
O efeito dotação é um viés cognitivo que leva as pessoas a colocar um valor maior nos bens que possuem simplesmente porque os possuem. Em virtude dela, as pessoas tendem a exigir mais dinheiro para se separar de um bem que possuem do que o dinheiro que pagariam para adquirir esse mesmo bem
 
O efeito dotação pode ser explicado pela tendência das pessoas em se concentrar mais nas perdas do que nos ganhos. As pessoas podem usá-lo para obter uma vantagem nas negociações. Uma maneira de reduzir o efeito dotação é fazer com que as pessoas considerem a transação a partir de uma perspectiva neutra, sem levar em conta o que elas já possuem.
 
28. EVENTOS RUINS
 
Os seres humanos tendem a ser mais sensíveis a perdas do que a ganhos e que essa tendência afeta a forma como lidamos com eventos ruins.

As pessoas tendem a superestimar o impacto negativo de eventos ruins e a subestimar sua resiliência para lidar com eles. Esquecem que a resiliência é uma das principais características que nos permitem lidar comtais acontecimentos.
 
Indivíduos também tendem a se concentrarem no presente e no imediato ao lidar com eventos ruins, em vez de olhar para o futuro e planejar estrategicamente como lidar com a situação.
 
29. O PADRÃO QUÁDRUPLO
 
O modelo padrão de tomada de decisão, que é baseado em maximizar a utilidade esperada, não é suficiente para lidar com a complexidade do mundo real. O autor sugere que o padrão quádruplo é uma maneira mais eficaz de lidar com a incerteza e a complexidade da tomada de decisão.
 
O "Padrão Quádruplo" é um modelo para a tomada de decisão baseado em quatro etapas.

Primeira etapa: identificar os objetivos e prioridades relevantes para a tomada de decisão. 
 
Segunda etapa: reunir informações relevantes e confiáveis que possam ajudar a informar a decisão. 
 
Terceira etapa: avaliar as alternativas disponíveis e seus potenciais resultados. 
 
Quarta e última etapa: tomar a decisão com base nas informações coletadas e nas avaliações realizadas.
 
30. EVENTOS RAROS
 
A "heurística da disponibilidade" leva um indivíduo a estimar a probabilidade de um evento com base em exemplos disponíveis em sua memória. Em outras palavras, as pessoas a superestimam a probabilidade de eventos raros se eles forem amplamente divulgados na mídia, mesmo que a probabilidade real seja muito baixa.

O "efeito da ancoragem" leva as pessoas a se basearem em suas estimativas em um valor inicial fornecido, mesmo que esse valor seja irrelevante ou aleatório, dubestimando a probabilidade de eventos raros se a ancoragem inicial for baixa.

É importante estar ciente dessas heurísticas e viéses cognitivos ao lidar com eventos raros. Também é necessária a preparação e o planejamento para eventos extremos, mesmo que sua probabilidade seja baixa, com o objetivo de reduzir o impacto desses eventos e aumentar a resiliência das pessoas e organizações.
 
31. POLÍTICAS DE RISCO
 
A "avaliação prospectiva" se refere à forma como as pessoas avaliam os resultados potenciais de uma ação futura.
 
Por causa da já abordada "aversão à perda", tem-se uma abordagem excessivamente cautelosa em relação ao risco, impedindo as pessoas de assumir riscos que poderiam levar a grandes ganhos.

É importante a transparência e a comunicação clara em relação aos riscos envolvidos em uma determinada ação. Muitas vezes as organizações são excessivamente confiantes em suas próprias habilidades de gerenciar o risco e que isso pode levar a decisões arriscadas e a eventos catastróficos.

32. DE OLHO NO PLACAR
 
As pessoas tendem a avaliar a qualidade de uma decisão ou de uma ação com base no resultado final, em vez de considerar os fatores que influenciaram a tomada de decisão. Isso pode levar a uma falta de compreensão sobre as razões pelas quais uma ação foi bem-sucedida ou mal-sucedida.

Segundo o conceito de "sorte do vencedor", existe uma tendência das pessoas de atribuir o sucesso a fatores internos, como habilidade e talento, e o fracasso a fatores externos, como má sorte e circunstâncias fora do controle. Ele destaca que essa tendência pode levar as pessoas a subestimarem o papel da sorte no sucesso e a superestimarem o papel da habilidade.

Kahneman também discute a importância de considerar os processos que levam aos resultados finais, em vez de se concentrar apenas nos resultados em si.
 
33. REVERSÕES
 
A "reversão de tendência" ocorre quando uma tendência ou padrão de comportamento é revertido inesperadamente. Ele explica que as pessoas tendem a subestimar a probabilidade de reversão de tendência e que isso pode levar a previsões imprecisas.

As pessoas são mais propensas a mudar de opinião quando são confrontadas com informações que contradizem suas crenças pessoais, em vez de informações que contradizem as crenças de um grupo ao qual pertencem. Além disso, há maior propensão a mudar de opinião quando se está em um ambiente que incentiva a considerar diferentes pontos de vista.

Embora as reversões possam ser desconcertantes, elas podem ser uma oportunidade para aprender e crescer.
 
34. QUADROS E REALIDADE
 
O autor também discute o conceito de "efeito moldura", que ocorre quando as pessoas respondem de maneira diferente a uma situação, dependendo de como ela é apresentada. Ele apresenta estudos que mostram que a mesma informação pode ser apresentada de maneiras diferentes para influenciar a resposta das pessoas. Por exemplo, uma opção pode ser descrita como "90% eficaz" ou "10% ineficaz", e isso pode levar as pessoas a responder de maneira diferente, mesmo que se refiram à mesma opção.

Assim, a forma como as pessoas constroem narrativas e como isso pode afetar sua percepção da realidade. As pessoas têm uma tendência a criar histórias coesas para explicar eventos passados, mesmo que essas histórias não sejam precisas.

PARTE 5 - DOIS EUS

35. DOIS EUS
 
O sistema 1 é responsável por processar informações de forma rápida e automática, usando atalhos mentais chamados de heurísticas. Essas heurísticas são úteis em muitas situações, mas também podem levar a erros de julgamento e tomada de decisão.

O sistema 2 é responsável por processar informações de forma lenta e deliberativa, usando raciocínio analítico e lógico. Embora este sistema seja mais preciso, também é mais exigente em termos de energia e recursos cognitivos.

O sistema 1 e o sistema 2 interagem entre si. É importante não confiar demais em nossos instintos e heurísticas automáticas, mas também não subestimar a importância do raciocínio lento e deliberativo.
 
36. A VIDA COMO UMA NARRATIVA

Os seres humanos têm uma tendência natural de moldar suas experiências em forma de histórias coerentes, com um começo, meio e fim.

Essa necessidade de estruturar nossas experiências em histórias é fundamental para a nossa compreensão do mundo e de nós mesmos. Ao construir narrativas, criamos uma sensação de coerência e significado em nossas vidas, e que isso pode ajudar a tornar nossas experiências mais digeríveis e gerenciáveis.

No entanto, Kahneman alerta que nossas narrativas podem ser imprecisas ou mesmo falsas. Nossa memória pode ser influenciada por fatores externos, como sugestões de outras pessoas ou nossas próprias expectativas, e como isso pode levar a uma distorção dos fatos e uma criação de histórias inconsistentes.
 
Nossas narrativas podem afetar nossas emoções e comportamentos, sugerindo que histórias negativas podem nos fazer sentir mais pessimistas e desesperançados, enquanto histórias positivas podem nos fazer sentir mais otimistas e confiantes.

É importante equilibrar nossas necessidades narrativas com uma compreensão precisa dos fatos. Devemos ser críticos em relação às nossas próprias histórias e estar dispostos a revisá-las à luz de novas informações e perspectivas.
 
37. BEM-ESTAR EXPERIMENTADO
 
O bem-estar experienciado é composto por dois componentes: a emoção momentânea e a avaliação cognitiva da vida como um todo. As emoções momentâneas são afetadas por experiências imediatas, como eventos positivos ou negativos, enquanto a avaliação cognitiva é uma visão geral de como as pessoas avaliam suas vidas como um todo.

Impende entender a diferença entre esses dois componentes de bem-estar para compreendermos melhor a felicidade das pessoas. Embora eventos específicos possam trazer emoções momentâneas positivas, eles têm pouco impacto na avaliação cognitiva da vida como um todo.

As pessoas usam diferentes estratégias para maximizar seu bem-estar. Algumas buscam experiências positivas momentâneas, enquanto outras se concentram em construir relacionamentos e atividades que fornecem uma sensação de significado e propósito em suas vidas.

Diferentes fatores afetam o bem-estar experienciado, como a riqueza, o sucesso profissional e as relações pessoais. Embora esses fatores possam ter um impacto significativo nas emoções momentâneas das pessoas, eles têm pouco impacto na avaliação cognitiva da vida como um todo.
 
38. PENSANDO SOBRE A VIDA
 
As pessoas tendem a ter uma visão excessivamente otimista do futuro, acreditando que terão mais controle sobre eventos do que realmente têm. Isso pode levar a escolhas ruins em termos de finanças, saúde e outros aspectos da vida.

Existe uma diferença entre a experiência e a memória de eventos passados. Embora a experiência do momento presente seja importante, as memórias dos eventos passados são fundamentais para a avaliação da vida como um todo. As memórias tendem a ser moldadas por eventos salientes e extremos, o que pode levar a avaliações distorcidas da vida como um todo.
 
A tomada de decisões é frequentemente influenciada por crenças e valores subjacentes. As pessoas devem tentar ser mais conscientes de seus valores e metas ao tomar decisões importantes em suas vidas.

É importante encontrar um equilíbrio entre o planejamento futuro e o desfrute do momento presente, buscando atividades significativas.

CONCLUSÕES
 
 É importante compreender como o nosso pensamento funciona e reconhecer a influência dos vieses cognitivos em nossas decisões e julgamentos. Os vieses não são apenas falhas no nosso pensamento, mas são características naturais da mente humana que nos ajudam a lidar com a complexidade do mundo.
 
Destaque-se a importância do aprendizado a partir das experiências de outras pessoas, em contraposição à ideia de que é preciso cometer erros para aprender. Podemos aprender muito com a observação de como os outros lidam com situações semelhantes às que enfrentamos.

Também é imprescindível o diálogo entre as diferentes disciplinas científicas, como a psicologia, a economia e a neurociência, para compreender de maneira mais ampla como funciona a mente humana. Apesar de a mente ser complexa e multifacetada, o conhecimento adquirido até o momento já pode ser útil para melhorarmos nossas decisões, nossas relações e nossas vidas de maneira geral.

sábado, 7 de agosto de 2021

Angelina Jolie sobre Gia Carangi: como interpretar a modelo impactou a atriz.




     Quando eu decidi streamar o filme Gia, há alguns anos, minha motivação era tão somente assistir minha atriz favorita (Angelina Jolie) interpretando uma modelo lésbica futurista, sapatona convicta, eu não vou deixar a inveja me ab.... Anyways...

     Tal é o destino que, após terminar o filme, fiquei impactada e acabei acrescentando a própria Gia Carangi (a real) à lista de mulheres das quais sou cadelinha.

     Por consequência, durante anos eu naveguei por sites, fóruns e afins e, apesar de encontrar bastante informação sobre a supermodelo, nunca tinha encontrado nada a vindo da própria Angelina. Apenas teorizava, como a especialista em Jolie que sou, que interpretar Carangi provavelmente tinha afetado Angie em razão da similaridade entre as personalidades. 

     Pois bem, anos após rodar a internet feito barata tonta, finalmente encontrei o capítulo de um livro biográfico com citações de entrevistas com a Angelina, na qual muitas as minhas teorias e intuições de expert foram confirmadas. Como não sei se esse capítulo existe em português, resolvi traduzí-lo e postar aqui. Espero que gostem.


Trechos extraídos e livremente traduzidos do capítulo "Star is Born", do livro "Angelina Jolie: A Biography", por Kathleen Tracy


     Mais de duzentas atrizes fizeram audições para o papel, incluindo Jolie. Surpreendentemente, Angelina não estava particularmente entusiasmada com a perspectiva de ser selecionada, com medo de que a "enlouqueceria ser tão aberta. Eu não queria fazê-lo. Eu não queria ir para aquele lugar. Era uma história tão pesada e lida com tantas questões. Se feito errado, poderia ter sido muito ruim e não ter dito as coisas certas, e poderia ter sido muito apelativo."

     O que convenceu Cristofer a escolher Jolie foi uma essência que ela compartilhava com Gia. "Angelina é provavelmente uma pessoa tão aventureira quanto Gia de muitas formas, mesmo não cedendo a todos os impulsos". Cristofer disse com diplomático eufemismo. "E ela tem a qualidade a qual me disseram que Gia tinha — inocência e vulnerabilidade penetrantes, as quais eu acreditava serem qualidades que das quais desesperadamente precisamos. Nas mãos da atriz errada, eu acho que Gia poderia ser uma pessoa que você não gostaria de conhecer."

     No entanto, Angelina não estava tão certa de que queria aceitar o papel. "Tinha muito na história com o que eu me identificava, então eu não queria meter o dedo. Gia foi emocional e literalmente abusada, mas ela tinha um fogo pela vida e pelo amor por mulheres". Ademais, Jolie se identificou com a dificuldade que Gia teve em se encontrar e lidar com a dor causada pelas pessoas não entendendo seu tipo particular de loucura.


     Mas no final, ela aceitou o desafio. "Gia tinha semelhanças tais comigo que eu achei que isso ou iria purgar todos os meus domônios, ou iria realmente mexer comigo." Jolie comentou. "Eu odeio heroína porque eu fui fascinada por aquilo. Eu não sou imune, mas não uso mais porque, por sorte, encontrei algo que substitui aquela sensação: o meu trabalho. E, provavelmente porque eu não queria o papel, porque eu estava com medo de onde iria me levar, os produtores sabiam que eu era a escolha certa".

     A primeira introdução de Jolie a Gia foi uma entrevista de 1983 (acho que a autora errou e a entrevista é de 1982, mas enfim...) na qual uma obviamente chapada Gia insiste estar sóbria. "Eu odiei ela," Angelina diz. "Eu não acreditei em uma palavra que ela estava dizendo e foi realmente difícil de assistir. Simplesmente triste." 


Contudo, quando ela viu algumas outras gravações de Gia, a opinião de Jolie foi suavizada. "Ela estava falando e sendo ela mesma, apenas essa garota normal da Filadélfia, e realmente engraçada e ousada e eu me apaixonei por ela," Jolie disse. "Eu acho que no fundo ela era uma pessoa boa que queria ser amada. Ela tinha um grande coração e um grande senso de humor e só queria mais animação."


     Enquanto ainda existem tantos atores que acham que interpretar um personagem gay vai afetar negativamente suas carreiras, Mitchell diz que realmente gostou de interpretar a namorada ficcional de Jolie. "Nós fizemos essa cena de amor na cama, onde a gente estava rindo tanto que a gente estava tremendo, a cama inteira estava tremendo," Elizabeth relembra. "O diretor estava gritando 'Parem! Parem!'". Sobre Jolie, Mitchell acrescentou, "Ela é real. Ela não se montou no cirurgião plástico. Ela é essa força da natureza. Ela é uma tempestade de fogo".

     Jolie estava igualmente sossegada com as cenas de sexo e comentou, "Pessoas ficam perguntando, 'Como foi dormir com uma mulher?' Foi bom, foi agradável. Qual o problema?" Ela minimiza a aparência física, dizendo "Eu realmente não vejo qualquer coisa física como importante. Quer dizer, eu não vejo mulher, homem, preto, branco. Eu não vejo uma pessoa com deficiência; Eu vejo a pessoa. Eu vejo a aura, a energia". 

     Gravar o filme foi uma experiência emocionalmente desgastante para Angelina, embora, de alguma forma, também tenha sido cartártico. "Eu me identifiquei muito com ela" Jolie diz. "Ela é o personagem mais próximo a mim que eu já interpretei. Mas de uma maneira estranha, interpretar Gia tornou possível para mim nunca me transformar nela... Eu sou capaz de botar tudo pra fora, ela não era".

     A colega de filmagem, Mercedes Ruehl diz que durante a filmagem a "cortesia de Angelina nunca falhava. Ela sempre era pontual, sempre preparada para algo emocionalmente pesado. Nenhum ator consegue entregar cena após cena sem ter um background técnico muito bom".

     De longe, as cenas mais difíceis do filme para Jolie e os colegas de cena foram aquelas nas quais Gia está morrendo, sem cabelo e com lesões decorrentes de sarcoma de Kaposi cobrindo seu corpo. Na mente de Angelina, foi com a morte que Gia finalmente encontrou paz. 

     Stephen Fried, que escreveu a biografia de Carangi, não vê o lado bom no fim da vida de Gia, contudo. "Ela não foi uma modelo que tinha alguns problemas. Esta garota não voltou pra Oklahoma e viveu uma vida diferente. Ela morreu," ele enfatizou. "Todo mundo pensa que a pior coisa que pode acontecer se você manda sua filha adolescente para Nova Iorque para ser uma modelo é ela não ter sucesso. A pior coisa que pode acontecer é o que aconteceu com Gia."

           Jolie tinha acabado de ganhar seu Globo de Outo por George Wallace quando Gia estreou na HBO. Ficou claro que Angelina tinha chegado. Ed Martin escreveu no USA Today, "Jolie está deslumbrante como a beleza condenada... Sua performance é notavelmente uma mistura consistente de força de aço e vulnerabilidade paralisante. Jolie expõe a verdadeira razão para a eventual autodestruição de Gia: a dor primorosa de relacionamentos difíceis com sua mãe egocêntrica, Kathleen, e sua amante lésbica frequentemente distante, Linda ... O filme Gia é tão difícil de resistir e tão difícil de encontrar quanto a modelo que lhe deu o nome e a mulher que a traz de volta à vida brevemente".

           O crítico do Los Angeles Times, Don Heckman, também foi efusivo: "Em um papel que a leva por uma montanha russa de emoções, obsessões e vícios, Jolie é convincente, o tipo de performance que se torna o centro de energia e foco de cada cena. Como a personagem que ela interpreta, ela tem a capacidade de ultrapassar o artificio e chegar no coração do drama".

           Michele Greppi do New York Post notou, "com todo respeito aos escritores, produtores e executivos da HBO, boa parte do crédito deve ir a Angelina Jolie. Ela bravamente, e até imprudentemente se joga em cada segundo. Cada momento, cada silêncio, cada lágrima é um desafio a todos ao seu redor para  acompanhá-la. O resultado é inesquecível."

           No fim, Jolie, que tinha inicialmente desgostado de Carangi, terminou sendo seduzida por ela. "Eu gostaria de namorá-la," ela disse à época. "Eu queria ser sua amante. Nas suas fotos, quando ela estava apenas numa boa, ela tinha esse sorrisinho atravessado, e ela parecia selvagem na sua jaqueta de couro. Quando ela estava livre e apenas sendo ela mesmo, ela era inacreditável; essa é a tragédia da história dela. Você pensa, 'Meu Deus, ela não precisava de drogas — ela era a droga'".

           Tão logo sua carreira parecia ter explodido, Jolie contemplava abandoná-la. Embora atores busquem papeis complexos e significativos, pode haver perigo em canalizar emoções obscuras e perturbadoras. Nos meses após o fim da produção de Gia, Angelina se viu a deriva. "Eu estava num lugar da minha vida onde eu tinha tudo o que eu achava que se deveria querer para ser feliz, e eu estava me sentido mais vazia que nunca" Jolie diz. "Eu estava com medo de partir como Gia. Eu precisava me afastar e me encontrar de novo."

           Angelina diz que durante o tour promocional de Gia, ela ia para casa e considerava seu relacionamento, seu casamento e a possibilidade de maternidade, e contemplava se ela seria uma mulher completa. Ela acredita que a origem de sua inquietude foi seu trabalho em Gia. "Eu me tornei exposta ao mesmo tempo que eu estava interpretando um papel sobre alguém sendo exposto. Eu me senti abatida. Ela não me sentia como uma pessoa boa. Eu me sentia má". Adicionando à tensão foi o fato de que seu trabalho em Gia coincidiu com o fim do casamento com Jonny Miller.

           A separação de Miller combinada com o mal estar pós-Gia fez Angelina desistir de atuar, ao menos temporariamente. Ela se mudou para Londres e se inscreveu em na escola de filme da Universidade de Nova Iorque, esperando se reinventar e recomeçar. "Foi bom para mim me afastar depois de Gia, não estar nos holofotes. Ninguém estava me trazendo capuccino de manhã. Eu estava no metrô com uma mochila e ninguém me conhecia."

        

segunda-feira, 19 de outubro de 2020

A POLARIZAÇÃO E O MEDO DE ESTAR ERRADO

Na era das mídias  sociais, o processo de formação de opiniões se torna cada vez mais pessoalizado, defensivo e irracional.

Compramos pacotes de opiniões conforme o 'lado' escolhido, ao invés de refletirmos sobre soluções viáveis para problemas concretos e individuais. Essa escolha raramente é feita com reflexão ou pesquisa. 

A seguir, postamos nossa opinião convicta e mal fundamentada em nossas redes. O perfil online, sendo um portfólio de nossa personalidade, cristaliza aquela conclusão irrefletida como parte de quem somos. A partir daí, qualquer questionamento feito a nossas perspectivas é tido como um ataque a quem somos. 

Frente a tal ofensiva, nos retraímos com nossos egos frágeis e doloridos, nos fechamos numa bolha de pessoas que partilham das mesmas conclusões que nós, e desumanizamos aqueles que estão nas outras bolhas. Perdemos a empatia. 

Se novos fatos surgirem, e provarem que nossas opiniões iniciais foram equivocadas, não tem problema! É só ignorar e criar uma realidade alternativa. Escolhemos assistir aos noticiários que dizem o que queremos ouvir. Os dados científicos, as estatísticas, os fatos cabalmente provados... Nada é suficiente, tudo é uma conspiração para fazer quem está na bolha passar pela pior humilhação a qual se pode ser submetido: estar errado.

sexta-feira, 24 de julho de 2020

O QUE HARVARD DIZ/DISPONIBILIZA SOBRE A CLOROQUINA (CQ) E HIDROXICLOROQUINA (HCQ)

A pesquisa pelo posicionamento da Harvard Medical School foi bastante efetiva e rápida. Uma das primeiras páginas sugeridas pelo Google é o próprio sítio institucional, que você pode acessar clicando aqui. Caso você não consiga a língua inglesa, segue um resumo das principais informações disponibilizadas.

CLOROQUINA E HIDROXICLOROQUINA


Segundo a publicação, que à época de minha consulta havia sido atualizada dia 23/6 (meu aniversário!), estudos preliminares demonstraram que a hidroxicloroquina e a cloroquina matam o vírus COVID-19 na placa de laboratório. Segundo observado, os medicamentos dificultam a ligação do vírus à célula, impedindo que o vírus entre; no entanto, se o vírus ainda assim conseguir entrar na célula, as drogas o matam antes que ele possa se multiplicar.
Quanto à azitromicina, sabe-se que há alguma ação anti-inflamatória, mas não há grandes informações sobre sua ação contra o COVID-19. 
O júri ainda não divulgou se esses medicamentos, isoladamente ou em combinação, podem tratar a infecção viral por COVID-19. A postagem menciona os estudos que associam problemas cardíacos e ineficácia na prevenção à CQ e HCQ, porém ressalta que alguns desses estudos foram criticados ou realizados com irregularidades. 
Por fim, o texto termina com a seguinte recomendação:
A cloroquina ou a hidroxicloroquina com ou sem azitromicina não devem ser usadas para prevenir ou tratar a infecção por COVID-19, a menos que esteja sendo prescrita no hospital ou como parte de um ensaio clínico.Os ensaios clínicos em andamento e prestes a serem iniciados para avaliar a eficácia desses medicamentos estão sendo retomados.

OUTROS TRATAMENTOS/PREVENTIVOS


O site da Harvard Medical School não aborda apenas a cloroquina/hidroxicloroquina. Apesar de a mídia (em especial aqui no Brasil) e o governo estarem hiperfocados nestes medicamentos, outras opções estão sob análises em diferentes instituições (vide a postagem sobre Stanford):
  • Plasma Convalescente:  o plasma do sangue de pacientes recuperados possui anticorpos e é usado no tratamento contra COVID-19. Referido tratamento já é adotado em alguns hospitais brasileiros. No entanto, requer estímulo à doação de plasma.
  • Dexametasona: assim como outros corticosteróides, trata-se de droga com efeito anti-inflamatório potente. Assim como a CQ  e a HCQ, são facilmente disponíveis e baratos. Em ensaios clínicos recentes, a dexametasona diminuiu o risco de morte em pacientes críticos. Contudo, até 23/6 os resultados da pesquisa não passaram pela revisão cuidadosa dos resultados. Muitos médicos estão tratando pacientes muito doentes com corticosteróides desde o início da pandemia, em virtude dos casos de  respostas hiperimune (por vezes letal) que danifica os pulmões e outros órgãos.  Cabe, contudo, a realização de estudos para definir o melhor momento para a administração dessa droga. 
  • Remdesvir: desenvolvido para tratar várias outras doenças virais graves (como ebola, p. ex.), o medicamento funciona inibindo a capacidade do coronavírus de se reproduzir e fazer cópias de si mesmo. No laboratório, ele inibiu a capacidade dos coronavírus que causam a SARS e a MERS infectar células em uma placa de laboratório. A droga também foi eficaz no tratamento desses coronavírus em animais. Estudos em humanos estão em andamento. Um estudo, publicado no New England Journal of Medicine, comparou o remdesivir com um placebo em mais de 1.000 pessoas hospitalizadas com COVID-19. Constatou-se que os pacientes que receberam remdesivir se recuperaram mais rapidamente do que aqueles que receberam um placebo (11 dias para o remdesivir e 15 dias para o placebo). A eficácia em pacientes mais críticos, no entanto, foi bem menor. O tratamento, ao contrário da CQ e HCQ, é aprovado pelo FDA.
  • Vitaminas C e D: segundo a publicação,"não há evidências de que o uso de vitamina C ajude a prevenir a infecção pelo coronavírus". Ademais, "altas doses podem causar vários efeitos colaterais, incluindo náusea, cãibras e aumento do risco de pedras nos rins". Já "a vitamina D pode proteger contra o COVID-19 de duas maneiras. Primeiro, pode ajudar a aumentar a defesa natural de nossos corpos contra vírus e bactérias. Segundo, pode ajudar a prevenir uma resposta inflamatória exagerada".



sexta-feira, 17 de julho de 2020

O QUE A STANFORD UNIVERSITY DIZ/DISPONIBILIZA SOBRE A CLOROQUINA E HIDROXICLOROQUINA

Após realizar minha pesquisa na plataforma do MIT, em busca de artigos produzidos/disponibilizados pela instituição, segui em frente com a investigação. 

OBS: caso algum estudo recente tenha sido realizado pela instituição quando você estiver lendo este post, favor mencionar nos comentários para que eu possa fazer a errata.
STANFORD UNIVERSITY
Na minha busca pelo posicionamento da Stanford Med acerca da cloroquina (CQ) e da hidroxicoloroquina (HCQ), descobri que em abril a instituição optou por realizar testes clínicos com a droga Remdesvir, preterindo assim a CQ e a HCQ.  Em entrevista publicada na plataforma da universidade, Stanley Deresinski, chefe da divisão de doenças infecciosas, afirmou: 
Sabe-se há 50 anos que a hidroxicloroquina possui propriedades antivirais inespecíficas. Mas, por enquanto, o remdesivir é o nosso agente preferido. 
Aruna Subramanian, professor que atua na área de doenças infecciosas, acrescentou:
A cloroquina está sendo usada um pouco demais sem o estudo adequado. [...] Preferimos ser orientados por dados, tanto quanto possível.
O presidente do departamento de Medicina de Stanford, Robert Harrington, realça a importância dos dados, do rigor científico e de testes clínicos randomizados:
Não podemos depender de histórias anedóticas para praticar a melhor medicina clínica. Temos que esperar pela ciência.
Em maio, os pesquisadores da Stanford lideraram ensaio clínico de interferon-lambda para COVID-19, conforme noticiado no site da instituição. Por fim, mais recentemente (no início de julho), começaram as pesquisas por participantes nos testes clínicos com a droga Favipiravir, segundo reportado pela universidade.
Apesar do alerta quanto à importância de testes clínicos randomizados, a plataforma med.stanford disponibilizou o ensaio clínico não randomizado que é aludido (e criticado pela falta de rigor científico) no artigo disponibilizado pelo MIT. Referido ensaio foi realizado pelo  Méditerranée Infection University Hospital Institute, de Marseille com uma amostra de 36 pacientes. Sua conclusão foi que as drogas antimaláricas, somadas à azitromicina, estão associadas à redução da carga viral de COVID-19. Como já comentei sobre ele no post sobre o MIT, não vou me repetir, mas você pode acessar o inteiro teor da pesquisa aqui e aqui.

No próximo post da série, veremos o posicionamento de Harvard quanto a medicamentos que se propõem a tratar a COVID-19. Fiquem ligados, sejam analíticos, PESQUISEM ANTES DE ABRIR A BOCA e até mais!!!

quarta-feira, 15 de julho de 2020

O QUE O MIT DIZ/DISPONIBILIZA SOBRE A CLOROQUINA E HIDROXICLOROQUINA

Encontramo-nos em meio a uma disputa acirrada entre a esquerda e a direita, uma pandemia global de COVID-19 e uma crise econômica que não deve dar trégua tão cedo. Para piorar, 'informações' contradizentes surgem de todos os cantos. Como consequência, a confusão generalizada se instala, dando margem à politização dos tópicos mais variados (inclusive científicos!). Contudo, felizmente contamos uma ferramenta fantástica chamada internet, que nos possibilita a realização de pesquisas e acesso ao acervo de instituições consolidadas. Assim resolvi conduzir minha própria pesquisa sobre cloroquina (CQ) e a hidroxicloroquina (HCQ), considerando as descobertas de universidades com reconhecidos programas de ciências naturais. Segue abaixo meu primeiro achado: um artigo disponibilizado pela MIT, considerada a melhor universidade do mundo. 
OBS: caso algum estudo mais recente tenha sido realizado pela instituição quando você estiver lendo este post, favor mencionar nos comentários para que eu possa fazer a errata.
MIT - Massachusetts Institute of Technology
O MIT disponibilizou esse artigo (também acessível aqui) sobre o assunto. 
RESUMO ► a publicação contém alertas quanto à toxicidade dos medicamentos (potencialmente fatal em tratamentos pediátricos) e problemas cardíacos. Afirma que a CQ pode causar convulsões e que o envenenamento pelo uso de ambas as substâncias pode ser tratado pelo uso intravenoso de altas doses de Diazepam e outros métodos . Conclui, assim:
A evidência científica atual não suporta tratamento ou uso profilático desses agentes para a doença de COVID-19. As autoridades reconhecem que CQ e HCQ podem oferecer pouco benefício clínico e apenas adicionar riscos, exigindo investigação adicional antes da distribuição pública mais ampla.
OUTRAS INFORMAÇÕES ► O artigo menciona dois casos: duas pessoas que foram hospitalizadas na Nigéria com overdose de HCQ; e um casal do Arizona que ingeriu fosfato de cloroquina preventivamente e acabou parando na emergência (o homem veio a falecer).
A seguir, é mencionada a falta de rigor em alguns testes. Como exemplo o artigo alude a um estudo francês no qual foram administradas doses diárias de 600mg de HCQ aos  pacientes. Dependendo da condição clínica, a azitromicina foi adicionada ao protocolo de tratamento. Durante o estudo, a carga viral dos pacientes era verificada e os autores afirmaram que "o tratamento com hidroxicloroquina estava significativamente associado à redução ou desaparecimento da carga viral em pacientes com COVID-19 e seu efeito foi potencializado ou 'reforçado' quando a azitromicina foi adicionada ao regime de tratamento". Os problemas apresentados pelo estudo são: amostra pequena (apenas 36 pacientes), limitado acompanhamento a longo prazo, 6 pacientes abandonaram o estudo, houve exclusão dos pacientes mais doentes, o uso da azitromicina não foi uniforme, houve falta de estudo randomizado ou grupo de controle verdadeiro. 
Ainda, segundo o artigo publicado pelo MIT, "o prolongamento do intervalo QT causado por esses medicamentos antimaláricos também pode ser exacerbado pela coadministração de azitromicina, particularmente em pacientes doentes com doença cardiovascular preexistente ou em pacientes com desequilíbrios eletrolíticos".
Foram citados os posicionamentos do FDA (no sentido de se ter cautela para não criar falsa e esperança e assumir o risco de causar mais dano do que vantagem) e da OMS (que ressaltou a importância de testes clínicos eticamente aprovados).
Por fim, em relação aos pronunciamentos do presidente Trump, o artigo concluiu: 
Acreditamos firmemente que outras proclamações do Poder Executivo que não sejam compatíveis com evidências médicas devem ser evitadas. Porque, se não houver benefício para uma terapia, só poderá haver riscos. 
No próximo post da série, veremos o posicionamento de Stanford. Fiquem ligados, sejam analíticos, PESQUISEM ANTES DE ABRIR A BOCA e até mais!!!